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01 April 2011

biutiful (2010)

O retrovisor começa a tirar o atraso em relação a filmes que entraram em cartaz nos primeiros meses do ano em São Paulo. Abaixo, alguns comentários sobre Biutiful, de Alejandro González Iñárritu.

Javier Bardem em Biutiful (Alejando Gonzáles Iñárritu, 2010)

Pela primeira vez em sua carreira, Iñárritu não trabalha com seu habitual roteirista (Guillermo Arriaga) e deixa de lado as estruturas não-lineares que marcaram os trabalhos anteriores da parceria. Mas a trama de Biutiful, mesmo com sua linearidade e com um personagem central, traz certo exagero que faz lembrar algo dos melodramas mexicanos (terra natal do diretor): nosso personagem principal não é poupado de nada, pelo contrário: visões de mortos, uma doença incurável, uma grande culpa a ser carregada, problemas com imigrantes ilegais, uma ex-esposa drogada e infiel, um irmão de idoneidade questionável...

A partir de uma Barcelona globalizada, revelam-se os contrastes entre o lado turístico e a pobreza dos imigrantes - africanos e chineses -, muitos deles ilegais. Iñárritu parece querer dar conta não apenas dos (vários) problemas de seu personagem principal, mas também fazer um discurso de certo "engajamento", de "denúncia" de um estado de coisas.

Nada contra a arte engajada, pelo contrário. O problema é cair em um denuncismo vazio, que segue a lógica do politicamente correto e demonstra uma "correta indignação" a respeito das questões "importantes" do mundo contemporâneo. Algo como "carregue um cartaz", "repita um grito de ordem", "assine um abaixo-assinado no facebook" e sinta-se melhor. Uma atitude longe do verdadeiro engajamento e, no fundo, extremamente conservadora. (Nesse momento, aparecem várias questões sobre o que seria um "verdadeiro" engajamento. Sinceramente, não temos como responder a isso. Porém, digamos por hora que, talvez, o engajamento deveria pressupor uma ação que escapasse do território do meramente simbólico.)

Voltando ao filme, Biutiful não é sobre imigrantes ilegais (mesmo que eles ganhem proeminência durante em determinados trechos). É, de fato, um filme sobre seu personagem e, de certa maneira, também sobre seu intérprete, Javier Bardem. (E, quanto mais Iñárritu se aproxima de seu personagem principal e deixa Bardem conduzir o filme, a tela de cinema cresce.)

É sempre muito difícil (e ao mesmo tempo gratificante) falar sobre um grande ator. Como expressar os movimentos, o gestual, as sutilezas de uma expressão. Bardem constrói um personagem cheio de ambiguidades: ao mesmo tempo enérgico e cansado; corajoso e hesitante; estrangeiro e espanhol. Apesar do exagero da trama, alguns momentos de delicadeza se sucedem: a descoberta de um cadáver jovem, vindo de um passado distante; a despedida dos filhos, frente à morte iminente; as caminhadas pela cidade que guarda em si também as angústias do personagem.

Talvez seja demasiado dizer se tratar de um filme de Bardem. O encontro entre um grande ator e um Iñárritu que, com todos os seus problemas, aposta nesse mesmo ator fazem de Biutiful, apesar de seus defeitos (como sua duração, talvez um pouco longa demais), um filme que está longe de ser desinteressante.

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