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14 July 2010

viajo porque preciso, volto porque te amo (2009)


Viajo porque preciso, volto porque te amo é um filme sobre deslocamentos.

À primeira vista, o deslocamento físico, a viagem em si. Um geólogo percorrendo o interior do Nordeste brasileiro: imagens de sertão, de aridez, estradas levando a lugares desconhecidos, pequenos entrepostos de beira de estrada, os faróis de caminhão indo em sentido contrário. Uma viagem que parece primeiro alívio, mas que depois se transforma em prisão.

A viagem acontece em meio à completa solidão. O personagem, que parece sequer conhecer sua história, realiza nas estradas vazias uma busca por si mesmo. Quem é essa voz que nos fala, essa voz separada das imagens? O personagem busca sua própria imagem, sua identidade. Ele nunca aparece em frente à câmera. As imagens vistas, o que seriam? O ponto de vista desse personagem incompleto? Suas memórias? Alucinações? Ou são "apenas imagens" que, no "acaso" da obra cinematográfica, acabaram se encontrando àquela voz masculina?

A memória do personagem se desloca para o passado e para o presente. Da solidão intensa, da lembrança da mulher amada, vem a certeza da separação e da dor. A paisagem inóspita do sertão é também o interior do personagem? À guisa de entrevista, uma prostituta conversa com o personagem. Estamos vendo um documentário ou uma ficção? A prostituição de beira de estrada já havia sido tema de Karim Aïnouz em O céu de Suely. E Marcelo Gomes capturara as viagens pelo sertão e as questões de identidade em Cinema, aspirina e urubus. Os dois diretores, juntos, parecem somar seus interesses, somar seus olhares. A busca de identidade entre dois cineastas se transforma na busca pela identidade de um personagem, pela construção de um filme.

As conversas versam sobre sonhos de consumo, sobre fugir daquele lugar. Talvez, fugir de si mesmo - será essa a intenção do geólogo? Ele funciona à base de listas: a mala arrumada, o material de trabalho, as compras em um posto de gasolina: coca-cola, camisinhas... Estamos às margens do capitalismo? Ou na desolação do capitalismo? Nas paradas da estrada, sempre uma coca-cola e uma prostituta.

Um último deslocamento: o personagem sobe uma escadaria. Lá do alto, anuncia que a paisagem vai se modificar completamente: com a construção de uma barragem, toda uma cidade será submersa. O sertão vai virar mar. O personagem olha o mundo de cima, tenta uma visão panorâmica, como se olhasse para sua própria história. Será ele também submerso pelo passado? Sua história estará perdida? Suas dúvidas serão resolvidas? Será que, ao final da história, o personagem ganha um rosto, uma imagem, uma identidade? Ou é o público que deve reconhecer, em si mesmo, todas as dúvidas desse belíssimo filme?

 Aqui, o site oficial.

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