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31 August 2009

o vazio

Outro filme invulgar sobre a morte é O quarto do filho (2001).


Nanni Moretti debruça-se sobre o luto de uma família. O funeral é filmado de maneira muito sóbria e atenta, concentrando-se em cada detalhe. Depois disso, os personagens tentam reencontrar o eixo de suas vidas, mas se deparam com o vazio (que, possivelmente, sempre existiu).

É preciso que a vida continue. Mas como? Mesmo que aparentemente o filme questione a eficácia da psicanálise, o processo de luto da família, a superação do vazio, só se completa quando surge em cena uma espécie de duplo da pessoa morta.

A perda é reencenada: esse novo personagem será conduzido a uma fronteira para se despedir dos demais, que deverão retornar.

O sentido maior de O quarto do filho está em seus detalhes: os hare-krishna que aparecem, sem nenhum alarde, quase por acaso, logo no início, indicam a afinidade com certas filosofias do Oriente. A praia, ao final, representa esse tempo e espaço onde, talvez perdidos, esperamos pela morte, última fronteira a ser cruzada.

É admirável que Nanni Moretti consiga tratar tema tão denso de maneira tão delicada. Lembra as recomendações de outro italiano (nascido em Cuba), Italo Calvino:
Se quisesse escolher um símbolo votivo para saudar o novo milênio, escolheria este: o salto ágil e imprevisto do poeta-filósofo que sobreleva o peso do mundo, demonstrando que sua gravidade detém o segredo da leveza, enquanto aquela que muitos julgam ser a vitalidade dos tempos, estrepitante e agressiva, espezinhadora e estrondosa, pertence ao reino da morte, como um cemitério de automóveis enferrujados. (Italo Calvino, Seis propostas para o próximo milênio, São Paulo: Companhia das Letras, p. 24)
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